quarta-feira, 22 de abril de 2015

Vingadores: Era de Ultron

O projeto que a Marvel Studios tem desenvolvido no cinema denota ambição e organização notáveis, com os realizadores tendo paciência na maneira como montam todo o quebra-cabeça de seus super-heróis. E algo admirável com relação a tudo isso é que, com poucas exceções (como o fraco Thor 2), essas adaptações de quadrinhos tem resultado em entretenimentos muito eficientes, e 2014 possivelmente foi o melhor ano do estúdio, com os ótimos Capitão América 2 e Guardiões da Galáxia. No fim, tudo isso culmina nos filmes dos Vingadores, e juntar todos os personagens que aprendemos a gostar ao longo dos anos (seja através do que é visto no cinema ou do próprio material de origem) é uma ideia naturalmente empolgante. Há três anos, ela conseguiu fazer jus a seu potencial, e agora em Vingadores: Era de Ultron as coisas não mudam muito.

Escrito e dirigido por Joss Whedon, Vingadores 2 começa trazendo os heróis em uma grande missão, na qual conhecem os gêmeos Pietro e Wanda Maximoff (Aaron Taylor-Johnson e Elizabeth Olsen, respectivamente). Esta última usa seus poderes telecinéticos para mexer com a cabeça de Tony Stark (Robert Downey Jr.), que passa a temer que ele e seus amigos não sejam o suficiente para proteger o mundo, medo este que ele já havia manifestado de certa forma em Homem de Ferro 3. Com isso em mente, ele cria com a ajuda de Bruce Banner (Mark Ruffalo) um programa para tentar proteger a todos, dando origem ao robô Ultron (James Spader). Mas o plano falha quando Ultron racionaliza que o maior mal da Terra são seus habitantes e que estes merecem a extinção, fazendo os Vingadores darem o máximo de si para detê-lo.

Logo de cara Joss Whedon aparenta não estar disposto a perder muito tempo durante a projeção. Na primeira sequência do filme, o diretor não apenas nos joga no meio da ação com os heróis, mas também os acompanha em um longo plano sem cortes que além de nos reapresentar a eles, ainda mostra que a dinâmica entre todos só melhorou desde a última vez que os vimos juntos. A partir disso, o roteiro se estrutura de forma a desenvolver o conflito principal com Ultron e as subtramas que o complementam, e é aí que Vingadores 2 encontra alguns obstáculos que prejudicam a narrativa, já que nem todos esses elementos se revelam interessantes. Por um lado, os conflitos ideológicos entre os personagens, principalmente Tony Stark e Steve Rogers (Chris Evans), soam naturais, significativos e até necessários naquele ambiente. Mas por outro, o filme também dá atenção considerável a um romance repentino entre duas figuras importantes, algo que, infelizmente, ganha contornos tão clichês que acaba incomodando sempre que surge na tela. Além disso, o roteiro por vezes apela demais para diálogos expositivos, inserindo-os de maneira pouco orgânica, como quando Pietro fala sobre o passado dele e da irmã.

Enquanto isso, as sequências de ação obviamente mostram-se grandiosas, conseguindo passar a impressão de uma ameaça global ao se passarem em várias partes do mundo e aproveitando bem os poderes dos personagens, que em determinados momentos combinam suas forças de modo criativamente eficaz. E se levarmos em conta que os heróis se distribuem entre o espaço da ação, é admirável que Joss Whedon não torne tudo uma bagunça, deixando sempre claro o que está acontecendo e onde está cada personagem. Sendo assim, não há como não destacar, principalmente, a já citada sequência inicial e todo o terceiro ato, com a grande batalha contra Ultron e seu exército de robôs. A única cena que não funciona tão bem nesse aspecto é a briga entre Homem de Ferro e Hulk, que lembra a ação exaustiva de O Homem de Aço, saturando o espectador rapidamente com toda a destruição que ocorre.

No entanto, por mais que Vingadores 2 tenha problemas claros, ainda assim trata-se de uma produção envolvente e divertida na maior parte do tempo, o que se deve principalmente porque Joss Whedon tem em mãos personagens absolutamente carismáticos, que ainda são interpretados por um elenco talentoso. De Robert Downey Jr. como Tony Stark até Chris Hemsworth e Scarlett Johansson como Thor e Natasha Romanoff, todos ali já conseguem encarnar seus papeis com os olhos fechados, tendo também uma bela química em cena, como pode ser visto na festa que ocorre no início. Mas há de se destacar em meio a isso o espaço surpreendente dado ao Clint Barton de Jeremy Renner, além das adições de Paul Bettany como o androide Visão (é dele a melhor gag do filme), e Elizabeth Olsen e Aaron Taylor-Johnson como os irmãos Maximoff, que conseguem ser cativantes mesmo com espaço reduzido em comparação aos heróis principais. Já o Ultron de James Spader é um vilão cuja ameaça fica evidente logo em sua primeira cena, sendo que suas motivações não poderiam ser mais claras e até compreensíveis, e algumas de suas falas estão entre as melhores do filme. Mas o personagem perde boa parte dessa força mais tarde, o que é um pouco decepcionante.

Vingadores 2 definitivamente não é o melhor filme da Marvel, mas ainda representa uma diversão bem acima da média, como quase todas as produções do estúdio. E considerando sua última cena, é um filme que consegue deixar o espectador ansioso pelo futuro da franquia, se organizando para que novos e promissores rumos possam ser dados a este ótimo grupo de heróis.

Obs.: Há uma cena durante os créditos finais.

Obs. 2: Não recomendo assistir a versão 3D, já que a conversão para a tecnologia mais prejudica a experiência de ver o filme do que qualquer outra coisa.

Nota:

domingo, 12 de abril de 2015

Séries: Demolidor


Quando foi anunciado que a Marvel iria trazer o Demolidor (um de seus melhores e mais populares personagens) em uma série da Netflix, isso veio como uma sacada inesperada e ao mesmo tempo interessante. Inesperada porque nos acostumamos a ver heróis desse calibre indo para o cinema, e quando os direitos do personagem voltaram para a Marvel, a ideia inicial parecia ser a de realizar um novo filme, que faria aquele estrelado por Ben Affleck em 2003 ser completamente esquecido. E interessante porque a Netflix vem exibindo uma ambição muito bem-vinda em termos de séries, sendo que os quadrinhos do Demolidor sempre mostraram potencial para render uma produção bacana, independentemente de sua mídia. Se a sacada foi boa, melhor ainda é ver como essa primeira temporada da série aproveita isso admiravelmente.

Criada por Drew Goddard (diretor do ótimo O Segredo da Cabana) e com produção executiva de Steven S. DeKnight (de Spartacus), Demolidor se passa tempos depois da Batalha de Nova York (vista em Os Vingadores) e segue o advogado Matthew Murdock (Charlie Cox), que ficou cego após um acidente quando criança (algo que aumentou o alcance de seus outros sentidos) e agora acaba de abrir uma firma junto com seu melhor amigo Franklyn “Foggy” Nelson (Elden Henson). Mas enquanto pratica a advocacia de dia, à noite ele usa suas habilidades físicas e sensoriais para virar um vigilante que cansou de ver sua cidade, em especial o bairro de Hell’s Kitchen, ser dominada por criminosos. Indo cada vez mais fundo em sua luta contra o crime e ganhando aliados aos poucos, como a enfermeira Claire (Rosario Dawson) e o jornalista Ben Urich (Vondie Curtis-Hall), Matt acaba batendo de frente com o misterioso empresário Wilson Fisk (Vincent D’Onofrio), cujas ideias para tornar a cidade um lugar melhor não têm uma natureza particularmente boa.

O que se percebe logo nos primeiros momentos de Demolidor é que por mais que tudo seja parte de um único universo, o mundo de Matt Murdock não é o mesmo de Tony Stark, Steve Rogers, Thor e todos os outros heróis da Marvel que vimos no cinema e na TV. Hell’s Kitchen é um ambiente sujo e brutal, no qual boas pessoas às vezes se veem obrigadas a cometer atos horríveis, sendo que elas crescem sem esperança por algo melhor. Esse universo sombrio é abraçado com gosto pelos realizadores, o que resulta em uma série com um tom mais adulto do que o de qualquer outra produção da Marvel Studios, com direito até a um nível de violência muito mais pesado (a maneira como Wilson Fisk arrebenta um inimigo ao final do quarto episódio é o ápice nesse quesito). Além disso, se outros heróis enfrentam figuras com armaduras de alta tecnologia armamentista, deuses asgardianos, alienígenas ou uma organização terrorista nazista, Matt Murdock encara o submundo do crime talvez em sua forma mais pura, com traficantes, estupradores, chefes do crime organizado e assim por diante, e a série deixa claro que esse é o foco do personagem logo no final do primeiro episódio, numa sequência que traz o protagonista golpeando um saco de areia, enquanto àqueles que ele realmente gostaria de socar seguem normalmente suas atividades.

Mas um detalhe que sempre contribuiu muito para que o Demolidor fosse interessante é que, como herói, ele anda numa linha tênue entre fazer o bem e ser alguém cujos atos são parecidos com os daqueles que ele condena. É algo que o filme de 2003 chegou a inserir em sua história, ainda que rapidamente. Mas na série isso aparece com mais força, principalmente na segunda metade da temporada, e não é à toa que muitos confundem o “Homem da Máscara” com um criminoso em vários momentos. Colocando o protagonista em excelentes discussões morais, que rendem alguns belos diálogos e ajudam no desenvolvimento do personagem, Drew Goddard e companhia novamente demonstram compreender a natureza do herói que têm em mãos, não se esquivando de questões importantes que o envolvem.

Tudo isso é captado perfeitamente ao mesmo tempo em que a série mostra uma calma notável quando o assunto é o desenvolvimento de sua trama e seus personagens. Em nenhum momento Demolidor parece ter pressa, apresentando os elementos da história naturalmente e desenvolvendo-os eficientemente, de forma que eles não se tornam peças desperdiçadas dentro do quebra-cabeça que é montado. Assim, a temporada até pode ficar calcada em Matt, Foggy e sua secretária Karen Page (Deborah Ann Woll) se esforçando para expor as atividades ilegais de Wilson Fisk, mas ao longo de dois ótimos episódios (o sétimo e o oitavo) ela quase pausa essa linha principal para desenvolver subtramas que se conectam ao passado do herói e do vilão, nos fazendo compreender um pouco mais como eles se transformaram naquilo que vemos. E se em termos de história a série se sai bem, o mesmo pode ser dito sobre o quesito ação, onde ela empolga ao aproveitar as habilidades de seu personagem o máximo que pode. Nisso, é impossível não destacar a luta que encerra o segundo episódio. Filmado em um longo plano aparentemente sem cortes (lembrando um pouco a famosa sequência de Oldboy, até por se passar em um corredor), esse confronto é um dos melhores momentos não só da série, mas também entre todas as produções que a Marvel já lançou.

E finalmente chegamos ao ótimo elenco, responsável por boa parte do investimento emocional que colocamos na série. Vivendo Matt Murdock com carisma e segurança essenciais, Charlie Cox faz dele um personagem que teme que seus atos sacrifiquem sua integridade e prejudiquem àqueles com quem se importa, conduzindo-o maravilhosamente bem por seus dilemas. Enquanto isso, Elden Henson e Deborah Ann Woll ganham espaço para fazer de Foggy e Karen Page figuras cativantes e inteligentes a sua própria maneira, além de ajudarem a ressaltar o lado puramente humano do protagonista, tendo uma ótima química com Cox (e é por isso que a série incomoda sempre que sugere um triângulo amoroso entre eles). E se Rosario Dawson deixa uma forte impressão como Claire (o que só ajuda a tornar decepcionante o fim de sua participação), Vondie Curtis-Hall faz de Ben Urich um jornalista que tenta se manter honesto e relevante mesmo que sua profissão já não peça mais isso. No entanto, se há um destaque absoluto no elenco de Demolidor este é Vincent D’Onofrio, que ganha a chance de conceber Wilson Fisk como um vilão imprevisível e implacável, mas que também tem um lado tímido, traumatizado e extremamente sensível, que ele deixa aflorar principalmente quando está com sua amada Vanessa Marianna (Ayelet Zurer) e até com seu braço direito, James Wesley (o ótimo Toby Leonard Moore), que, inclusive, consegue ser quase tão ameaçador quanto seu chefe.

Depois da ótima Agents of SHIELD (que pode ter tido um início razoável, mas melhorou consideravelmente em sua atual segunda temporada) e da excelente Agent Carter, a Marvel dá mais um bom passo no mundo das séries com Demolidor. E esperemos que uma nova temporada (ou quem sabe um novo filme?) seja anunciada em breve. Afinal, como indica a ponta solta deixada no fim do sétimo episódio, há muitas coisas para explorar com esse personagem e será ótimo vê-lo novamente em ação.

sexta-feira, 10 de abril de 2015

Coherence

Orçamentos milionários ajudam uma série de produções a criarem os universos grandiosos onde se passam suas histórias ambiciosas e brilhantemente concebidas, e filmes como A Origem não me deixam mentir. No entanto, há realizadores que conseguem usar um orçamento limitadíssimo para desenvolver uma narrativa que se mostra tão complexa e instigante quanto as de várias superproduções. E é aí que se encaixa Coherence, ficção científica que marca a estreia de James Ward Byrkit como diretor. Tendo cerca de 50 mil dólares em mãos, o cineasta realiza uma obra que deve ser uma das mais fascinantes que o gênero produziu nos últimos anos.

Escrito pelo próprio Byrkit a partir do argumento que ele desenvolveu em parceria com Alex Manugian, Coherence começa apresentando quatro casais: Emily e Kevin (Emily Baldoni e Maury Sterling), Beth e Hugh (Elizabeth Gracen e Hugo Armstrong), Lee e Mike (Lorena Scafaria e Nicholas Brendon) e Laurie e Amir (Lauren Maher e o argumentista Manugian). Eles se reúnem em uma noite para um jantar de reencontro, exatamente quando um cometa está passando pela Terra. O fenômeno é o possível responsável por certas anomalias, como problemas na eletricidade e celulares quebrando repentinamente. Mas esses são os menores dos problemas que o grupo de amigos passa a enfrentar durante a noite, já que logo descobrem que a realidade na qual vivem pode não ser a única a coexistir nesse momento.
Com um conceito complexo por natureza (até mesmo a teoria do gato de Schrödinger entra no jogo), o roteiro é brilhante ao explorá-lo o máximo que pode, desenvolvendo-o com inteligência, de forma que o menor dos detalhes (como um curativo) pode vir a causar uma diferença no fim das contas. Assim, Byrkit insere seus personagens em um quebra-cabeça que confia na inteligência do público, nos fazendo pensar constantemente em como cada uma de suas peças se encaixa no contexto geral do filme. Se há outras realidades coexistindo com aquela para a qual somos apresentados, elas trariam os personagens realizando sempre as mesmas coisas? Ou eles estariam com personalidades diferentes e tomando outras decisões? São possibilidades que o roteiro leva em consideração e tornam o filme ainda mais instigante. Claro que, para que tudo fique evidenciado para o espectador, os diálogos acabam sendo bastante expositivos, mas mesmo estes surgem organicamente na narrativa, já que os próprios personagens buscam entender o que está acontecendo, chegando inclusive a fazer marcações para estabelecer algumas coisas.
Mas ainda que seja uma ficção científica que se concentra principalmente em suas ideias, em nenhum momento Coherence se esquece de seus personagens. E se James Ward Byrkit desenvolve com propriedade a inquietação natural decorrente da situação que a história cria, vale dizer que ele encontra uma tensão adicional nas relações entre aqueles casais, não só por conta do passado que cada um tem com o outro (Kevin, por exemplo, pode estar com Emily, mas já esteve comprometido com Laurie), mas também da desconfiança diante do fato de que eles podem muito bem não pertencer à realidade na qual se encontram. Esse desconforto perante a possibilidade de não ser parte daquele núcleo, ou de pensar que alguém não está em sua realidade original, de certa forma envolve aquelas figuras em tons interessantes de Vampiros de Almas, mas sem a parte conspiratória e os alienígenas, obviamente.
Com um elenco eficiente, que encarna com naturalidade seus personagens, Coherence é o tipo de filme que termina já fazendo o espectador ter vontade de assisti-lo novamente. Não por ser complicado de entender em uma primeira sessão, mas, sim, porque a cada visita outros detalhes podem ser percebidos, tornando a experiência de assisti-lo ainda mais rica. E é sempre bom quando um filme chega a esse ponto.
Nota:

Cada Um na Sua Casa

Diferente de sua rival, a Pixar, que só começou a falhar com alguma frequência recentemente, a DreamWorks sempre teve um histórico de altos e baixos em relação as suas animações. Se por um lado o estúdio é responsável por filmes admiráveis como Formiguinhaz, Como Treinar o Seu Dragão ou os recentes Os Croods e As Aventuras de Peabody e Sherman, por outro nunca deixaram de realizar obras que conseguem ser no máximo medíocres, como O Espanta Tubarões, Bee Movie e a franquia Madagascar. Sendo assim, é difícil ficar surpreso quando surge outra escorregada, como este Cada Um na Sua Casa, que mostra ser uma das animações mais fracas que o estúdio realizou nos últimos anos.

Escrito por Tom J. Asle e Matt Ember a partir do livro de Adam Rex, Cada Um na Sua Casa nos apresenta aos alienígenas da raça Boov, que encontram na Terra o lugar perfeito para escapar de seus inimigos, os Gorgs. No entanto, um de seus membros, o atrapalhado Oh (voz original de Jim Parsons), põe em risco a localização de todos e se vê tendo que fugir de seus companheiros. Mas no caminho ele conhece a jovem Tip (Rihanna), que por sua vez está em busca de sua mãe, que foi enviada para a comunidade humana que os Boovs organizaram quando chegaram ao nosso planeta. Em meio a desentendimentos, Oh e Tip ajudam um ao outro, começando uma inusitada amizade... E o resto você já deve saber.
Cada Um na Sua Casa é o tipo de filme cuja qualidade é possível perceber logo em seus primeiros minutos. Ao apresentar Oh como aquela velha figura chata e inconveniente, mas que tenta despertar a compaixão, e consequentemente a simpatia, do espectador através de seu bom coração e visual engraçadinho, já temos indícios de que originalidade foi um conceito que os realizadores jogaram fora sem pensar muito. E o restante da projeção apenas comprova isso, com o desenvolvimento da trama se revelando bastante óbvio, desde o relacionamento entre Oh e Tip até certas reviravoltas, como o porquê de os Gorgs estarem perseguindo os Boovs. Aliás, falando na raça de nosso protagonista, o filme até busca provocar o riso com o jeito nada diplomático de sua forma de agir, como ao exilarem os humanos e ocupando os espaços na Terra como se o planeta sempre tivesse sido deles. Mas o tiro meio que sai pela culatra, já que as criaturas soam mais irritantes do que propriamente engraçadas.
Na verdade, em termos de diversão o filme se sai muito mal, seja pelas gags pouco inspiradas, pelo timing problemático da condução de Tim Johnson (diretor responsável pelo eficiente Os Sem-Floresta também da Dreamworks) ou pelo simples fato dos personagens serem desinteressantes demais. Isso inclui até mesmo Tip, uma menina bem aborrecida, que, ao lado da patetice nada cativante de Oh, dá ao filme uma dupla de protagonistas que praticamente o condena ao fracasso. Por sinal, a amizade dos dois é desenvolvida não só de maneira comum e previsível, mas também superficial, com direito a uma montagem musical rápida e preguiçosa para mostrar a evolução da relação deles e de como passam a se importar um com o outro, o que não é o suficiente para que formem uma ligação com o público.
Cada Um na Sua Casa é uma daquelas animações que aparenta pensar que qualquer coisa que fizer renderá sorrisos no rosto do espectador. Mas a verdade é que isso só ajuda a fazer dela uma produção boba e entediante, ainda que seu público-alvo seja as crianças, que certamente mereciam um entretenimento melhor do que este.
Nota:

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Força Maior

É mais do que normal alguém proteger sua família diante do perigo iminente e só depois pensar em si mesmo. O instinto de sobrevivência, nesses casos, geralmente fica em segundo plano, já que o principal objetivo do indivíduo é ter certeza de que àqueles que ama estão seguros. Mas eis que Força Maior desenvolve sua história em cima de um momento no qual uma pessoa pensou apenas na própria sobrevivência. O resultado disso é um drama familiar com um ambiente constantemente desconfortável, que rende situações em que o riso se torna nossa única arma diante dos atos dos personagens.

Escrito e dirigido por Ruben Östlund, Força Maior se passa nos alpes franceses durante as férias de Tomas (Johannes Kuhnke), sua esposa Ebba (Lisa Loven Kongsli) e os filhos Harry (Vincent Wettergren) e Vera (Clara Wettergren). O lugar é maravilhoso e todos tentam se divertir e aproveitar o tempo da melhor maneira possível. Mas logo no segundo dia uma avalanche ocorre e, quando todos pensam que ela causará um grave acidente, Tomas corre por sua vida, deixando sua família para trás. Mas tudo não passa de um susto, e seu ato covarde resulta em uma série de questionamentos por parte de Ebba sobre o posicionamento dele com relação à família.
A primeira cena de Força Maior já estabelece um pouco o clima entre os personagens. Tentando tirar uma foto juntos, eles parecem não saber posar como uma família feliz, precisando ser instruídos pelo fotógrafo para que isso dê certo. Se isso mostra que o ambiente familiar está descompensado, a partir da avalanche a situação se agrava, pois a tensão criada diante da covardia do pai e marido é tratada como algo inconcebível e abala qualquer confiança existente naquele núcleo. O roteiro passa então a fazer um belo estudo psicológico sobre a forma como o homem deve agir em situações extremas. Teria Tomas fugido por não se importar com a família? Ou simplesmente não há como saber o que fazer em um momento como esse? Talvez o fato dele ser um homem fraco seria a forma mais adequada de encarar essa situação, mas as questões levantadas pela trama são interessantes demais para nos contentarmos apenas com isso.
Tal estudo é desenvolvido pelo roteiro através de cenas em que o desconforto se dá pelo constrangimento que se cria em volta dos personagens. Nesse aspecto, aliás, o filme não deixa de causar algumas boas risadas ao longo da narrativa, e o fato delas fazerem parte da proposta do filme e não soarem involuntárias é algo notável no trabalho de Ruben Östlund. Quando os amigos Mats (Kristofer Hivju) e Fanni (Fanni Metelius) são puxados sem querer para dentro da discussão, por exemplo, é engraçado como eles se sentem diante do que está acontecendo com aquela família. Da mesma forma, é impossível não destacar a cena em que Tomas recebe uma cantada, momento que ajuda a indicar o quão patética é sua situação.
Irônico e inquietante em medidas iguais, Força Maior coloca em xeque quem as pessoas realmente são, sabendo explorar com propriedade as consequências do modo como elas se revelam. Assim, o filme se mostra sociologicamente ambicioso, representando uma escolha interessante da Suécia para o Oscar 2015, ainda que não tenha conseguido a indicação.
Nota:

quarta-feira, 8 de abril de 2015

O Imperador

Quando se vê Nicolas Cage e Hayden Christensen no mesmo filme, logo de cara os piores pensamentos passam pela cabeça. Afinal, de um lado temos um ator reconhecidamente talentoso, mas que vem afundando a carreira cada vez mais graças a sua entrega à canastrice e às porcarias que decide estrelar. Do outro, há um rapaz cuja carreira até começou bem, mas desandou quando se mostrou aborrecido e inexpressivo ao interpretar um dos principais personagens de Star Wars, e nada do que fez depois foi muito interessante (nem mesmo Jumper, 2008, seu maior sucesso de bilheteria desde então). E, infelizmente, os pensamentos ruins se confirmam ao longo deste O Imperador.

Escrito por James Dormer, O Imperador se passa no século XII e tem início em uma batalha das Cruzadas no Oriente Médio. Ali somos apresentados a Jacob (Christensen) e Gallain (Cage), guerreiros cujas ideias com relação aos confrontos entram em conflito. Três anos depois, o imperador chinês é assassinado por seu filho mais velho, Shing (Andy On), que deseja assumir o poder a qualquer custo, colocando a culpa do crime em seu irmão, o jovem príncipe Zhao (Bill Su Jiahang) e herdeiro do trono por direito. Com a acusação, este terá que fugir, ao lado da irmã, Lian (Liu Yifei), para garantir sua sobrevivência. É então que encontram em Jacob uma chance de escaparem, ainda que ele não tenha muita vontade de ajudá-los inicialmente, mudando de ideia ao ver neles uma oportunidade para se redimir por seu passado.
Herói relutante em busca de redenção: check! Vilão querendo ser imperador: check! Príncipe foragido e que tenta provar sua inocência: check! Só por sua base, percebe-se que o roteiro de O Imperador se apoia em clichês atrás de clichês para compor sua história, e à medida que esta se desenvolve outros elementos batidos vão surgindo, como um pequeno romance entre Jacob e Lian. Assim, o filme mostra ser uma obra genérica, que segue uma fórmula clara e, por isso, se torna previsível, sendo que nem chega a ter algum esforço por parte dos envolvidos no projeto para tentar surpreender, como se estivessem artisticamente no piloto automático.
Comandado pelo coordenador de dublês Nick Powell em sua estreia como diretor, O Imperadortraz sequências de ação que nada empolgam e ainda se mostram visualmente confusas. Esse aspecto do filme, aliás, se torna mais problemático quando levamos em conta o fato dele não conseguir criar algum envolvimento entre o público e os personagens, de forma que pouco interessa o que acontecerá com eles. E Powell, por algum motivo, acha que inserir constantemente planos inclinados e esporadicamente uma câmera lenta deixará as cenas cativantes, enquanto que isso serve mais para chamar atenção para ele próprio do que qualquer outra coisa. Talvez o momento que mais se destaque seja quando vemos Gallain treinar um pequeno Jacob enquanto este treina o jovem Zhao, mas mesmo isso é conduzido de modo desajeitado.
Hayden Christensen (em seu primeiro trabalho depois de quatro anos longe das telas) assume o papel de Jacob com sua habitual falta de carisma, além de não encarnar convincentemente alguns problemas do personagem, como seu vício em ópio. Já Nicolas Cage, que fica sumido durante quase toda a primeira hora de filme, aparece não só com um sotaque britânico curioso como Gallain, mas também elevando seus maneirismos a máxima potência, o que soa forçado demais e viram motivo de risos, ainda que involuntários (as cenas em que o personagem fica bêbado são o ápice do exagero).
O Imperador tenta ser um épico mesmo não tendo propriedade suficiente para tanto. No fim, é uma daquelas produções irrelevantes que provavelmente seria lançada direto no mercado de home video. Isso caso não fosse estrelada por dois atores que, de um jeito ou de outro, ainda detém certa popularidade.
Nota:

O Passado (2007)

A partir da década de 1990, Hector Babenco passou a ser um diretor menos ativo do que fora nos anos 1970 e 1980, com seus projetos tendo espaço de tempo de até sete anos entre um e outro. Esse intervalo diminuiu um pouco depois do grande sucesso alcançado por Carandiru, em 2003, com Babenco voltando a lançar um filme logo em 2007, que veio a ser este O Passado, produção que representou uma espécie de retorno do cineasta às suas origens argentinas.

Baseado no livro de Alan Pauls, o roteiro escrito por Babenco em parceria com Martha Goés nos apresenta ao tradutor Rímini (Gael García Bernal), que se separa da esposa, Sofía (Analía Couceyro), depois de doze anos de casamento. Apesar de a separação ser bastante amigável, as coisas entre eles não ficam tão bem resolvidas, o que não impede Rímini de seguir sua vida normalmente, arranjando novas namoradas e conseguindo melhores oportunidades em seu trabalho. Mas Sofía constantemente esbarra nele, se mantendo presente em seu dia a dia e revelando uma espécie de obsessão, o que causa um impacto inesperado.
As aparições repentinas de Sofía poderiam ser consideradas movimentos forçados e até esquemáticos por parte do roteiro. Mas a verdade é que eles acabam sendo perfeitos para ilustrar a ideia que o filme tenta passar. Babenco monta aqui uma obra que mostra quase de maneira literal como o passado pode perseguir as pessoas. Neste caso, Rímini decide ignorar boa parte dos pedidos da ex-esposa ao final do relacionamento (principalmente quando ela solicita que ele escolha as fotos com as quais gostaria de ficar), como se não conseguisse encarar seu passado, que insiste em segui-lo enquanto determinadas coisas não forem resolvidas. E o modo como a história se estrutura envolta dessa ideia não deixa de ser ideal, mostrando como a vida do protagonista acaba sendo afetada pelas decisões que ele toma com relação ao que já viveu.
No entanto, se o roteiro acerta nisso, o mesmo não pode ser dito sobre a narrativa em si, que vai se tornando pouco envolvente depois de um tempo. É algo que se deve em parte pelo desenvolvimento corriqueiro da trama. Em uma cena, por exemplo, vemos Riminí presenciando um momento trágico envolvendo sua namorada, Nancy (Mimí Ardú), apenas para que na cena seguinte ele já apareça casado com a colega de profissão Carmen (Ana Celentano), que logo depois aparece grávida. Com as coisas ocorrendo tão rapidamente, Hector Babenco não consegue impedir que o filme tenha sérios problemas de ritmo, e a história infelizmente perde muito do peso que exibia inicialmente.
Enquanto isso, o talentoso Gael García Bernal interpreta Riminí com sua segurança habitual, fazendo dele um homem que abraça sem pudores a nova vida, mas que fica relutante e um pouco amedrontado sempre que Sofía aparece em sua frente. Isso até deixa certa curiosidade com relação ao porquê de eles terem se separado, detalhe que nunca é explicado pelo roteiro. Já Analía Conceyro convence na forma como encarna o jeito obsessivo e até dependente de Sofía, surgindo sempre com uma bela presença, ainda que a personagem cause desentendimentos que soam um tanto convencionais.
O Passado empalidece quando comparado a outros trabalhos de Hector Babenco, como os excepcionais Pixote: A Lei do Mais Fraco e O Beijo da Mulher Aranha. Mas, de modo geral, ainda mostra ser uma obra satisfatória do diretor, que encontra sua principal força na ideia central que o rege.
Nota:

Como Eu Odiava Matemática

“Quero morrer”. “É podre”. “Me enche de raiva”. Esses são alguns dos comentários que se ouve com relação à Matemática logo no início deste Como Eu Odiava Matemática, documentário dirigido por Olivier Peyon. São frases com as quais qualquer pessoa que não se dê bem com a matéria pode se identificar, e pensamentos do tipo “por que devo estudar isso se não usarei no futuro?” são uma consequência até inevitável disso, ainda que, convenhamos, seja algo egoísta de se dizer considerando que não são só os detratores dos números quem precisam lidar com eles. No entanto, por mais detestada que seja por boa parte das pessoas (para não dizer a maioria delas), a Matemática tem uma importância inegável, e Peyon mostra isso com propriedade em seu filme, explorando no processo os motivos para ela ser vista como chata e complicada, além de deixar claro o amor que matemáticos nutrem por ela.

Como Eu Odiava Matemática começa com uma leveza curiosa, o que não deixa de ser bem-vindo considerando as complexidades do assunto que irá tratar ao longo da narrativa. Sendo assim, é notável que Olivier Peyon comece o filme focando a parte escolar e universitária, apresentando as visões que professores e alunos têm da matemática para, a partir disso, poder focar o porquê dessa disciplina parecer tão difícil para muitas pessoas. É então que o diretor traz fatos curiosos, desde livros que preferem usar explicações complicadas demais para coisas que poderiam ser mais simples até casos em que há vários métodos para ensinar a matéria, e nem todos são muito fáceis ou cativantes. Além disso, também deve ser considerado que a matemática obriga todos a pensarem, o que é um problema quando a maioria não aprende a desenvolver um raciocínio lógico, decorando apenas o suficiente para poder passar em provas, como ocorre em praticamente todas as disciplinas.
Por outro lado, é notável a admiração que matemáticos têm por seu objeto de estudo, e vale dizer que eles veem nisso coisas que passam despercebidas pelos leigos. Nesse sentido, é bacana que o documentário retrate a matemática quase como uma forma de arte, sendo tocante a fascinação que um deles mostra ao descrever pontos de uma escultura. Assim, é compreensível que Cédric Villani, um dos principais nomes no ramo e ganhador da Medalha Fields, honraria da União Internacional de Matemática, se refira a disciplina como algo sexy em determinado momento. E se o filme começa leve, mais tarde ele ganha um tom sério ao tratar o papel que a matemática exerceu em eventos importantes, chegando a mencionar o desafio de Alan Turing em decifrar a máquina Enigma na Segunda Guerra Mundial, episódio que foi retratado no recente O Jogo da Imitação.
Como Eu Odiava Matemática não faz as pessoas que não gostam da matéria criarem algum gosto por aquilo que a envolve, e esse nem é um de seus objetivos. Se isso por acaso acontecer, é provável que elas voltem atrás logo no primeiro logaritmo que surgir em sua frente. Mas é um documentário que ressalta detalhes importantes, e por isso mesmo acaba sendo interessante.
Nota:

Uma História Real

Assistindo a Uma História Real, não deixa de surpreender a constatação de que ele é dirigido por David Lynch. É o trabalho que mais se diferencia do restante da filmografia do diretor, o mais acessível tanto em termos de narrativa quanto de história. Contudo, isso não torna essa produção menos interessante, pelo contrário, já que é uma das melhores de Lynch e talvez a mais emocionante de sua carreira, trazendo no centro um belo estudo de personagem, com uma maravilhosa atuação do saudoso Richard Farnsworth.

Baseado em, bem, uma história real, o roteiro escrito por John Roach e Mary Sweeney segue Alvin Straight (Farnsworth), que aos 73 anos tem sua cota de sérios problemas físicos e de saúde. Ao ficar sabendo do derrame sofrido por seu irmão, Lyle (Harry Dean Stanton), com quem se desentendeu e não fala há dez anos, ele decide ir contra as recomendações de todos, incluindo sua filha Rose (Sissy Spacek), e atravessar o estado para visitá-lo, fazer as pazes. Teimando que precisa fazer isso sozinho, Alvin encontra em seu carrinho cortador de grama o jeito ideal, ainda que inusitado, para realizar a jornada.
Os trabalhos dirigidos por David Lynch geralmente causam alguma espécie de estranhamento pelo modo como abordam a natureza humana. Talvez por isso, vê-lo ligado a uma produção como Uma História Real seja algo tão inesperado. Em nenhum momento o filme chega a ganhar contornos mais sombrios, mantendo do início ao fim a leveza de sua história. É um verdadeiro road movie, de roteiro calcado nos contatos de Alvin com várias pessoas pelo caminho. No entanto, se tematicamente a trama não parece fazer o estilo de Lynch, fica claro desde o início que é mesmo ele quem está no comando da narrativa, em virtude dos movimentos de câmera, como o travelling de abertura, e outros aspectos, como a linda trilha de Angelo Badalamenti.
Em meio a isso, Uma História Real mostra ser um conto sensível sobre a importância da família. Alvin demonstra saber que, por mais que haja discussões e problemas, as relações familiares podem ser o grande apoio que precisamos. Assim, todas as pessoas que ele encontra são tocadas por sua história de vida. No processo, compreendemos os motivos para ele querer rever seu irmão. Mesmo que não possamos continuar acompanhando personagens como Crystal (Anastasia Webb), menina que tenta pegar uma carona no meio da estrada, ou os irmãos gêmeos mecânicos Harald e Thorvald (Kevin Farley e John P. Farley), imaginamos que eles terão uma convivência melhor com seus entes queridos depois de ouvir as palavras de Alvin. Nesse sentido, é impossível não destacar a cena em que ele menciona a brincadeira envolvendo um graveto, sem dúvida um dos melhores momentos do filme.
Alvin, por sua vez, é vivido admiravelmente por Richard Farnsworth em seu último papel no cinema (ele suicidou cerca de um ano depois da estreia). O ator brilha ao fazer de Alvin uma figura extremamente doce e frágil, por sua postura em cena, por seu olhar, além de trazer uma determinação tão grande para o personagem que nunca duvidamos do êxito da jornada, mesmo que todas as pessoas ao seu redor tenham certeza que ele não passará do primeiro terço do caminho. É uma atuação delicada, não à toa reconhecida com uma indicação ao Oscar.
Uma História Real foi uma mudança de rumo temporária na carreira de David Lynch. Em seus filmes seguintes, Cidade dos Sonhos e Império dos Sonhos, ele voltaria a montar narrativas atípicas como aquelas com as quais nos acostumamos ao longo de sua carreira. Mas o fato de ele ser capaz de fazer um “feel good movie” tão bom quanto suas obras autorais apenas comprova ainda mais seu imenso talento.
Nota:

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Velozes & Furiosos 7

Como sempre falo, não sou fã de Velozes & Furiosos, sendo esta uma franquia bastante irregular mesmo depois de ter mudado sua fórmula nos últimos anos. Sim, alguns de seus filmes conseguem divertir moderadamente, como é o caso do quinto exemplar, ambientado no Brasil. Mas é uma série que a qualquer momento pode representar um entretenimento desastroso, como foi em seu segundo filme (o pior de todos). Dito isso, se Velozes & Furiosos 6 foi uma aventura no máximo medíocre, a franquia volta a divertir neste sétimo capítulo, que lamentavelmente chega aos cinemas sob a sombra da morte precoce de Paul Walker, tentando então fazer jus a um de seus grandes astros naquele que é o último trabalho dele. E claro que aqui “fazer jus” significa colocar no filme tudo o que a franquia passou a oferecer recentemente, mas numa escala mais grandiosa.

Escrito pelo mesmo Chris Morgan que está na posição de roteirista da série desde o terceiro filme, Velozes & Furiosos 7 pega o gancho do final do capítulo anterior, que mostrou que o vilão Owen Shaw (Luke Evans) tem um irmão mais velho, Deckard (Jason Statham), que ao ver o caçula numa cama de hospital jura vingança a Dom Toretto (Vin Diesel), Brian O’Conner (Walker) e companhia. Eles, por sua vez, estão em paz pela primeira vez em muito tempo, tendo finalmente voltado para casa. Mas depois que Deckard elimina Han (Sung Kang) em Tóquio e deixa o agente Hobbs (Dwayne Johnson) fora de combate, Dom junta forças com o oficial do governo Sr. Ninguém (Kurt Russell), levando sua equipe a missões que podem ajudá-los a localizar Shaw, que fica em seu encalço constantemente.

Como é de costume na série, Velozes & Furiosos 7 tem um fiapo de história, de forma que se o roteiro se concentrasse apenas na trama principal envolvendo Deckard Shaw, o filme não teria uma duração das mais longas. Sendo assim, Chris Morgan insere subtramas pouco interessantes e até clichês que quase fazem o filme perder o foco, enrolando a história, trazendo personagens que não fariam muita falta caso fossem cortados (como o terrorista vivido por Djimon Hounson) e deixando o filme bem inchado. É uma jogada do roteiro que soa bastante forçada, tendo como objetivo claro aumentar a escala do projeto e servir como desculpa para as várias cenas de ação que ocorrem durante a projeção. Na verdade, o fato de o filme se dar ao luxo de trazer nomes conhecidos por seu lado badass, como Ronda Rousey e Tony Jaa, apenas para lutarem em cena é prova de que os realizadores não ligam para nada a não ser às pancadarias e perseguições que vemos na tela.

Em meio a isso, o diretor James Wan se vê tendo que deixar de lado os traços que o tornaram conhecido em filmes de terror (é ele o responsável por Jogos Mortais e pelo ótimo Invocação do Mal), abraçando o estilo e o absurdo da série sem medo algum. Dessa forma, como já vimos em outros exemplares de Velozes & Furiosos, constantemente vemos os personagens realizarem peripécias inimagináveis, desafiando as leis da física (como quando eles saltam de um avião com os carros) e se revelando figuras sobre-humanas, ideia com a qual o cineasta até brinca pela maneira como Hobbs quebra um gesso em uma das cenas mais engraçadas do filme. Claro que em determinados momentos Wan falha ao não conseguir deixar a ação compreensível, e o tiroteio que ocorre no fim do segundo ato beira o desastre nesse sentido, mas seu trabalho é eficiente na maior parte do tempo, com a ação mostrando-se apropriadamente eletrizante e até divertida.

Enquanto isso, se Vin Diesel, Paul Walker, Michelle Rodriguez, Tyrese Gibson (que novamente é um péssimo alívio cômico) e Ludacris não chegam a tornar seus personagens muito cativantes quando vistos individualmente, isso muda um pouco quando os vemos como uma unidade familiar. Por esse lado, a dinâmica entre todos é interessante por mostrar o quanto eles se importam uns com os outros. Já Dwayne Johnson vira quase um figurante de luxo que tem seus músculos mais uma vez explorados sempre que possível, ao passo que Jason Statham faz o que faz melhor: usa sua persona de cara durão e carrancudo ao encarnar Deckard Shaw, com a única diferença de ele ser o vilão da história. E Kurt Russell se destaca por claramente se divertir no papel do Sr. Ninguém, personagem que parece ter saído direto da franquia Missão Impossível.

Velozes & Furiosos 7 pode não fazer nada de diferente dentro da franquia, trazendo mais do mesmo e seguindo à risca a fórmula que foi estabelecida para esses filmes. Mas mesmo assim funciona melhor do que boa parte dos exemplares dessa série que parece não saber a hora de pisar no freio.

Obs.: A homenagem a Paul Walker no final ficou bacana.

Nota: