sábado, 30 de maio de 2015

Turbo Kid


(Crítica originalmente publicada no Papo de Cinema)

Assistir a Turbo Kid é testemunhar o que aconteceria caso Mad Max se encontrasse com uma aventura de super-herói típica da década de 1980, adicionando a isso vários litros de sangue. É uma mistura inusitada, para dizer o mínimo, e que à primeira vista até pode parecer uma receita destinada ao fracasso. Mas o trio de diretores François Simard, Anouk Whissell e Yoann-Karl Whissell acerta nessa abordagem, conseguindo realizar um longa que, por mais insano que seja pontualmente, é surpreendentemente divertido e até mesmo adorável. E acreditem, eu não esperava usar a palavra “adorável” para descrever um filme que, em certo momento, traz uma cena bem gráfica na qual um personagem usa uma serra circular para partir alguém em pedaços.

Escrito pelos próprios diretores, Turbo Kid se passa no futuro pós-apocalíptico de 1997 (sim, é isso mesmo), quando chuvas ácidas já arrasaram o mundo, que agora é chamado de Terra Devastada e está completamente em ruínas, tendo a água como um bem valioso (novamente voltamos a Mad Max). Nessa realidade, um solitário Garoto (Munro Chambers) tenta sobreviver como pode, ganhando quando menos espera uma companheira, a jovem Apple (Laurence Leboeuf). No entanto, quando ela é sequestrada, o rapaz repentinamente encontra uma maneira de encarnar seu super-herói favorito – Turbo Rider – tornando-se o Turbo Kid. É então que ele se vê tendo que encarar a vilania do líder desse mundo arrasado, Zeus (Michael Ironside), e para derrotá-lo tem a ajuda não só de Apple, mas também do cowboy Frederic (Aaron Jeffery).
Turbo Kid é tão oitentista que praticamente pertence àquela década. Seja pelo visual, pelas músicas ou pelos efeitos sonoros, no momento em que entramos no filme já se tem a impressão imediata de que não se trata de um terreno contemporâneo, de forma que não é uma surpresa que a história se passe no “futuro” de 1997. E isso não é nenhum demérito, muito pelo contrário. Seu objetivo é ser assim, representando uma homenagem até nostálgica. Dessa forma, seguindo suas influências, o design de produção faz um ótimo trabalho ao conceber aquele universo a partir de sucatas, exibindo a falta de recursos existente por ali, detalhe que também atinge um pouco os figurinos e sua aparência um tanto surrada, o que não os impede de serem bastante chamativos em suas particularidades, como a máscara de metal do capanga de Zeus ou o visual “Homem sem Nome” de Frederic.
Considerando que se trata de uma história pós-apocalíptica, é notável que as cores em Turbo Kid não sejam drenadas da tela como é de costume em boa parte das produções do gênero. O trio de diretores aposta em um visual bastante colorido que vemos desde o uniforme vermelho que o Garoto usa na maior parte do tempo até as roupas azuis de Apple, sem falar nos cenários e no sangue que espirra diversas vezes. E, novamente, esses são detalhes que se encaixam perfeitamente, combinando com a energia contagiante que os realizadores impõem à narrativa, que entretém mesmo quando o gore ganha espaço, já que este é tratado de maneira tão absurda e cartunesca que acaba divertindo junto com outros aspectos do filme (e quando não leva ao riso, ao menos dá algum peso às ações dos personagens).
Mas além dessas qualidades, Turbo Kid ainda conta com um bom elenco. Munro Chambers revela um bem-vindo carisma, fazendo do Garoto alguém que se acostumou com a solidão, mas que eventualmente vê o valor que uma amizade pode ter naquele universo. Nisso, a dinâmica entre ele e Apple é importantíssima, sendo responsável por boa parte do porquê de o filme ser “adorável”, e aqui a atuação sempre sorridente da encantadora Laurence Leboeuf também merece destaque. E se Frederic é um cara durão e cativante nas mãos de Aaron Jeffery, Zeus é um contraponto até curioso a todos eles, representando mais um vilão para a coleção de Michael Ironside, cuja carreira ao longo dos anos ficou marcada por personagens do tipo.
É verdade que nem tudo corre às mil maravilhas em Turbo Kid. Apesar de momentos inspirados (como o corte de uma martelada para um quadrinho escrito “splash”), a montagem não insere organicamente alguns flashbacks da história, principalmente no início, ao passo que as cenas de ação são conduzidas de um jeito meio desengonçado. Mas no fim são pormenores que não chegam a atrapalhar o conjunto da obra, que surpreende com toda a diversão e a nostalgia que proporciona com suas sacadas e personagens.
Nota:


Nenhum comentário: