terça-feira, 17 de novembro de 2015

Túmulo dos Vagalumes

(Crítica originalmente publicada no Papo de Cinema)
“21 de setembro de 1945. Essa foi a noite em que eu morri”. Assim, logo nas primeiras falas, Túmulo dos Vagalumes estabelece que a história a ser contada não manterá o espectador confortável e seguro quanto a um destino feliz dos personagens. Tendo em mãos um material de peso imensurável, Isao Takahata (um dos principais nomes do Studio Ghibli, ao lado de Hayao Miyazaki) realiza um conto impactante pela maneira como mostra a guerra tirando o chão das pessoas gradualmente. Mirando um público mais maduro, o diretor corta a ideia equivocada das animações servirem exclusivamente para crianças.
Escrito pelo próprio Takahata, a partir do livro de Akiyuki Nosaka, Túmulo dos Vagalumes acompanha o jovem Seita e sua irmãzinha Setsuko, que tentam sobreviver como podem nos últimos meses da Segunda Guerra Mundial. Após a morte da mãe durante um ataque aéreo que devastou parte da cidade de Kobe, os dois passam um tempo com a família da tia, mas não demora até que sintam necessidade de tentar cuidar um do outro por conta própria.
Com uma história dessas, é lógico que o coração do filme está na relação entre os irmãos, ligação tão forte que criar empatia por eles é fácil, sobretudo em virtude da situação de vulnerabilidade em que se encontram, algo que Isao Takahata trata com imensa sensibilidade. Vemos Seita colocar a vida de Setsuko sempre em primeiro lugar, protegendo-a de qualquer mal (como quando ele a afasta de um corpo na praia) e tentando animá-la, ao passo que na maior parte do tempo a garota exibe uma visão inocente sobre o que ocorre ao redor, achando em pequenas preciosidades motivos para sorrir, como nas balas de frutas recorrentes ao longo da história, ou nos vagalumes que iluminam o abrigo onde fica com o irmão. A dupla encontra forças mutuamente para continuar seguindo em frente, para sobreviver em tempos difíceis, mesmo diante de obstáculos que teimam em querer derrubá-los.
É principalmente a partir desse aspecto que Isao Takahata explora o horror representado pela guerra na vida dos irmãos. Não tentando amenizar os problemas que Sentai e Setsuko enfrentam por conta dos recursos limitados, o diretor cria imagens inquietantes, sejam as marcas nos corpos deles, deixadas pelos mosquitos, ou o resultado da desnutrição. São momentos dolorosos, exatamente pela identificação que criamos com os personagens e sua miserabilidade. Takahata mostra como a desumanidade inerente à guerra pode afetar cruelmente até aqueles que nada têm a ver com ela, sendo capaz de jogar vidas fora por força de um poder que, no fim, é até uma futilidade diante da própria humanidade.
Filmes do calibre de Túmulo dos Vagalumes são marcantes e profundamente arrasadores. Não só por terem personagens como Seita e Setsuko ou pelo peso de suas histórias, mas também porque são obras que não ignoram aquilo que há de pior no mundo, nem como isso pode impactar o que há de melhor. E por mais difícil que seja absorver tamanho abalo emocional, no final esta fantástica produção do Studio Ghibli acaba provando nossa capacidade de sermos humanos.
Nota:

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